Maio e a poesia

Ana Carolina Santos
3 min readMay 31, 2017

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Foto de Victor Souza.

Em abril, li dois poemas marcantes que citam o mês de maio. O primeiro foi “Cantada”, de Ferreira Gullar. Já o conhecia, mas foi especial reencontrá-lo.

Cantada

Você é mais bonita que uma bola prateada
de papel de cigarro
Você é mais bonita que uma poça d’água
límpida
num lugar escondido
Você é mais bonita que uma zebra
que um filhote de onça
que um Boeing 707 em pleno ar
Você é mais bonita que um jardim florido
em frente ao mar em Ipanema
Você é mais bonita que uma refinaria da Petrobrás
de noite
mais bonita que Ursula Andress
que o Palácio da Alvorada
mais bonita que a alvorada
que o mar azul-safira
da República Dominicana

Olha,
você é tão bonita quanto o Rio de Janeiro
em maio
e quase tão bonita
quanto a Revolução Cubana

O segundo foi “Outono”, da Ledusha. Não o conhecia. Trombei com ele num post aqui mesmo no Medium. O clique foi instantâneo.

Outono

afasto esse poema que vaga pelo quarto
passional com um postal
carioca

nefasto esse poema
que detesto
como detesto
os dias lindos
de maio

Fiquei tentando reparar o que de tão bonito tinha os dias de maio. E de fato os poetas têm razão. Vi poesia em todo lugar. Os dias ensolarados. Os dias frios. Os dias com um sol geladinho. (Nunca havia reparado em quão frio é o mês de maio.) Li muita poesia e até escrevi algumas das minhas.

A poesia. Sempre que vejo um poema de que gosto na internet, tiro print ou foto e guardo na galeria do celular. Esses dias, na Travessa de Botafogo, vi um livro que não me era estranho. “O livro das semelhanças” é o nome da criança. Parido por Ana Martins Marques. Abri numa página aleatória e dei de cara com um poema que residia na minha galeria há tempos. Segue:

Fiquei fortemente tentada a comprar o livro, mas já era o fim de maio e eu tive de deixar pra junho. Ah, em maio li meu primeiro livro de poesia completo, “Milk and Honey”, de Rupi Kaur, que se tornou um favorito na mesma hora.

my heartbeat quickens at
the thought of birthing poems
which is why i will never stop
opening myself up to conceive them
the lovemaking
to the words
is so erotic
i am either in love
or in lust with
the writing
or both

[Meu batimento cardíaco acelera com
a ideia de parir poemas
e é por isso que não vou nunca parar
de me abrir para concebê-los
o fazer amor
com as palavras
é tão erótico
que ou estou apaixonada
ou tenho tesão
pela escrita
ou ambos] (Tradução livre)

Espero que esse último dia de maio seja tão poesia quanto os outros trinta.

Atualização em 1º de julho de 2017: Mudei a header para essa foto do meu amigo Victor Souza, de Arapongas (PR). Nós trocamos cartas e ele me enviou essa imagem revelada, como antigamente. Ele disse: “Tirei essa foto com a câmera analógica que eu usava como enfeite no meu quarto. A qualidade não está muito boa, vou precisar comprar outra e, quando isso acontecer, te enviarei uma melhor. Escolhi essa foto porque eu tirei ela em maio e você escreveu um texto sobre maio e, se não estou enganado, é o único mês em que essas árvores ficam cheias de flores cor de rosa e é lindo! Essa também é uma das ruas que eu mais gosto daqui de Arapongas, a Rua Condor, pelo menos dessa quadra pra cá.”

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